Andressa Kikuti lamenta que mesmo este facto da falta do debate de projectos entre os dois candidatos, embora incomodando “editores e redacções”, não tenha transparecido para o público: 

“Aliás, parte dos grandes media pouco fizeram, ou quase nada, para alertar a população sobre o risco de eleger um sujeito que faz flirt com o fascismo, incita ao ódio e violência contra as minorias, questiona a legitimidade do processo democrático e do seu oponente. Traveste-se de uma postura ‘neutra’, como fez, por exemplo, a Folha de S.Paulo – bastante criticada em texto de João Filho para o The Intercept Brasil, no qual ele defende que a neutralidade no segundo turno é ‘refúgio dos cobardes’.” (...) 

“Informações de bastidor reveladas por um funcionário do portal R7 ao The Intercept Brasil expõem mais directamente a parcialidade travestida de neutralidade imposta por ordens vindas ‘de cima’.” 

 Segundo o depoimento,

“Após o Edir Macedo ver que o Alckmin não decolaria e declarar via Facebook que apoiaria Bolsonaro, a redacção deu uma guinada. Passamos a publicar exclusivamente coisas positivas sobre o candidato do PSL e coisas mornas sobre Haddad, Ciro e Alckmin.”

“Passado o primeiro turno, começou o jogo sujo. Nada de pauta negativa ao Bolsonaro, a não ser que seja um assunto de grande visibilidade. A gente pode subir pautas positivas do Haddad, mas geralmente elas não são chamadas na capa nem nas redes sociais. Ou seja: ninguém vê.” (...) 

Como prossegue Andressa Kikuti, “se as pessoas desconfiam dos media (dependendo do caso, com certa razão), acaba ficando difícil diferenciar informações jornalísticas de informações vindas de outras fontes – como aquelas transmitidas via redes sociais e WhatsApp, por exemplo, cujo modo de produção é completamente diferente do modo de produção da notícia (essas não têm comprometimento algum com ética profissional ou verificação dos factos)”. 

“Junte essas duas coisas com a revolta, o medo e a desesperança da população gerados pela crise política, e tem-se aí receita da pólvora que pode explodir a democracia no país. A crise de confiança no jornalismo e a crise política estão entrelaçadas, e se retroalimentam.” (...) 

A concluir, e referindo-se ao “monstro” da desinformação, a autora que citamos afirma: 

“Ainda que a luta contra o monstro esteja longe de acabar, e que ainda não tenhamos as armas necessárias para liquidá-lo de vez, sabe-se que caminho contra a desinformação passa pela reconquista da credibilidade do jornalismo enquanto instituição capaz de trazer informações verdadeiras, contextualizadas, plurais e úteis para a população.” (...)

 

O artigo citado, na íntegra, no Observatório da Imprensa