O autor começa pelas questões incontornáveis trazidas pela revolução digital: 

“Como lidar com essas novas bases de mediação social? Como manter os provedores de informação jornalística quando muitas pessoas se acostumaram a consumir bens simbólicos aparentemente de graça? Como manter o jornalismo num tempo em que outros canais oferecem informações que aparentemente podem substituir o noticiário convencional?”  (...) 

Como explica mais adiante, estamos a falar “não só de uma indústria de bilhões, mas também de um mercado de trabalho de milhões de pessoas, de uma actividade social que cumpria uma função única e de um importante escudo da democracia, da cidadania e da civilização”.  (...) 

E reconhece que o título do seu livro gera uma expectativa enorme, e que “um volume de cento e poucas páginas não soluciona a crise”: 

“Eu arrisco algumas saídas, claro, e discuto-as dentro dos contextos em que elas se apresentam. Mas o meu livro é, acima de tudo, um convite para discutirmos a crise do jornalismo,  (...) com uma preocupação especial pela crise no mercado e na indústria brasileiros.”  (...) 

Sobre a situação no seu país, Rogério Christofoletti afirma que “a indústria brasileira tem particularidades, sim, e a estrutura de oligopólios no sector, um comportamento temerário do empresariado em inovar e a falta de unidade dos profissionais contribuem para uma configuração distinta”: 

“Mas é preciso ver o Brasil como o continente plural que é. Temos um jornalismo maior que muitos países europeus, um mercado consumidor de notícias invejável e capacidades técnicas e profissionais incríveis. Ao mesmo tempo, nosso jornalismo não é influente como o europeu, há imensos desertos de notícia  (...)  – e muitas vezes nosso jornalismo é provinciano, servil aos interesses comerciais mais imediatos, descompromissado com um projecto de país e extremamente paroquial.”  (...) 

“Enfrentar a crise do jornalismo no Brasil não é apenas inventar formas de sustentá-lo economicamente. É também enfrentar esses contradições internas, é também refazer pactos com os públicos e assumir uma função de mediação social e de defesa de valores humanos, muitas vezes ignorados.”  (...) 

“Isto é, o jornalismo precisa de mostrar à sociedade que ainda é muito útil e imprescindível, e que ninguém faz o que ele costuma fazer. As redes sociais não informam as pessoas. Os grupos de WhatsApp aprofundam a desinformação. O jornalismo precisa voltar a perseguir as suas vocações e demarcar claramente o que pode oferecer aos cidadãos, às sociedades.”  (...) 

O autor cita alguns casos de “produtos jornalísticos criativos, distintos e desafiadores” no Brasil, muitos deles ao nível de iniciativas locais, mas também o modo como se relacionam com as grandes plataformas: 

“O YouTube, que poderia ser uma evolução da TV, ainda é um mistério para os jornalistas, mas há casos de figurões que apostam nessa vitrine, como é o caso do William Waack, do Fernando Morais e do Bob Fernandes, para ficar em poucos exemplos. O YouTube ainda é um terreno altamente dominado por criadores de conteúdo de entretenimento no Brasil, e nenhum jornalista nacional se aproxima do rebanho que tem um Whindersson Nunes, que não oferece notícias mas tem mais de 35 milhões de telespectadores.” 

“Não imagino que algum jornalista se aproxime desse alcance, mas observar as potencialidades desse canal para chegar ao público é importante. Bem como é vital rediscutirmos o papel que têm as redes sociais e as grandes plataformas que estão drenando, não só recursos de publicidade do jornalismo, mas pior: estão devorando a atenção das pessoas, que passam mais tempo vendo banalidades do que se informando para tomar suas pequenas e grandes decisões diárias…”  (...) 

“Eu me preocupo muito com o jornalismo local por uma razão muito simples: a crise do jornalismo acontece em meio a uma crise de confiança nas instituições. Isto é, a democracia está sendo questionada, o sistema de representação política está sendo questionado, a escola e a ciência estão sendo colocados contra a parede. É uma época muitíssimo complicada porque nossos sistemas de crenças parecem estar se dissolvendo diante dos nossos olhos. Isso acontece no nível macro e no micro.”  (...) 

“Imagine uma cidade de 20 mil habitantes que tem um jornal impresso diário, duas emissoras de rádio e um site local de informação. Ora, com uma configuração dessas, com profissionais cobrindo os problemas da cidade, acompanhando a rotina da prefeitura e do comércio local, e monitorando a Câmara de Vereadores e a segurança pública, teremos uma sociedade com mais potencial de enfrentar os seus problemas próximos.”  (...) 

“De qualquer forma, penso que parte das soluções para a crise do jornalismo passa pelo fortalecimento dos meios locais. E não basta que a gente apenas ‘curta’ ou ‘compartilhe’ o conteúdo desses meios. Precisamos assiná-los, fazer parte deles, ajudá-los a pagar suas contas. Se a pessoa gasta 30 reais com a Netflix, por que não pode ajudar a manter dois ou três meios locais que pedem 10 reais mensais? Precisamos de pensar sobre isso.”  (...)

 

A entrevista aqui citada, na íntegra no Observatório da Imprensa