Contrariar a desinformação “online” com novas e úteis ferramentas
A autora propõe aos leitores que façam este caminho como numa linha de metro, em cujas estações, que servem determinados bairros da superfície, convida a sair sucessivamente.
A primeira é a dos nomes usados. Myriam Redondo define os bots como “contas automáticas, programadas para realizar uma ou outra acção, mas que iludem cada vez mais a detecção colocando ao comando seres humanos que interêm de modo temporal” (os chamados “perfis ciborgs”).
Chama aos trolls “contas anónimas utilizadas para violentar conversas”; sobre os utentes que estão por detrás, partilha como exemplo alguma da informação já conhecida sobre os trolls russos.
A respeito de fake news, recorda que a agência Associated Press recomenda que, sempre que seja usada a expressão, se explique ao leitor o que se entende por ela.
“Os peritos desaconselham o seu uso porque inicialmente se referia a mentiras verificáveis mas, por exemplo, Donald Trump serve-se destes termos para desacreditar trabalhos de media de que não gosta, sem mais.”
“Nos Estados autoritários as fake news são a desculpa para prender a oposição; as posições críticas são assim classificadas, o que permite prender os seus autores. Há inclusivamente governos que usam o ‘trolling patriótico’ para expulsar das redes os dissidentes, como sucede nas Filipinas.” (...)
A segunda estação é a das ferramentas. Myriam Redondo explica que há hoje técnicas e recursos que permitem apurar a pesquisa e o crivo da informação digital (newsgathering & curation). Cita um trabalho seu, Verificación digital para periodistas, onde podem ser encontradas.
Nomeia, por exemplo, Inteltechniques, T-Hoarder e Gephy e recomenda o site Follow the hashtag, para contas suspeitas. Sobre conteúdos, aconselha Maldita.es e Snopes. Tem mais informação sobre os problemas da detecção de desinformação em vídeo.
Sobre a questão da educação - por que se difunde uma mentira? - a autora afirma que “o cepticismo também se ensina” e fala da necessária “alfabetização mediática” e da responsabilidade das universidades. Cita um estudo da Universidade de Stanford, de 2016, sobre a avaliação da informação.
Mas reconhece que “não há ferramentas infalíveis” e que é mais importante ensinar técnicas ou protocolos [de procedimento] do que confiar tudo a ferramentas concretas.
Passando a área das plataformas tecnológicas, retoma críticas conhecidas de todos - em resumo, que contribuíram, voluntária ou involuntariamente, para a expansão da desinformação.
São acusadas de cinco coisas: “consentirem um elevado número de contas falsas sem se preocuparem por detectá-las ou eliminá-las; criarem algoritmos que promovem conteúdos sensacionalistas e não de qualidade; terem falta de transparência, com uma atitude entre o ambíguo e o matreiro quando se lhes pedem dados da sua actividade; desprotegerem os dados privados dos cidadãos, expondo-os a propaganda personalizada de risco, e não prestarem atenção à inclusão de publicidade política nos seus espaços, sem comprovarem quem a financiava e se eram entidades estrangeiras”. (...)
A autora descreve o que sucedeu com a utilização abusiva de dados pessoais pela Cambridge Analytica durante a campanha presidencial nos EUA, o que levou o Senado a chamar Mark Zuckerberg a prestar contas.
Sobre a Cidade da Imprensa, também tem muito que dizer, e não é tudo agradável:
“Todos os meios, os novos como os tradicionais, contribuíram para a poluição informativa actual. Por questões de sobrevivência, competiram pela atenção entrando no jogo dos títulos sensacionalistas e enganosos (clickbait), que cumprem a função de atrair o leitor para um conteúdo que não dá aquilo que promete. (...) Também tentaram competir no terreno da rapidez, que deixa pelo caminho muita comprovação e fiabilidade. (...) Um atentado é um bom exemplo: dão-se logo o número e os nomes dos atacantes e a conta das vítimas; daí a pouco é preciso fazer correcções. Costumam atribuir-se os factos a minorias étnicas ou religiosas quando ainda faltam provas.” (...)
Outro fenómeno tem sido “a desinformação sobre a desinformação”:
“Alguns meios dramatizam a importância das notícias falsas e dos bots porque isso atrai leitores, sobretudo se é possível perfilar un inimigo externo.” (...)
Na estação da Política, Myriam Redondo fala da desinformação orquestrada por Governos concretos, ou sofrida por Governos afectados por ela, ou noutros casos invocada por Governos que assim “apimentam discursos de medo” que funcionam como cortinas de fumo de outros problemas nacionais.
Também nos Parlamentos a desinformação acaba por ser usada como arma de arremesso entre partidos políticos, “quanto a sua observação e redução devia obedecer ao princípio de neutralidade e a interesses do Estado”.
Sobre a Lei, a autora menciona vários exemplos recentes de um esforço, em países europeus, por criar normas legais que sejam úteis neste combate. Mas não deixa de lembrar que, “para além das iniciativas legais, a melhor acção dos Governos contra a desinformação é garantir a existência de uma Imprensa realmente independente e livre de ingerências”.
Na última estação, sobre o Futuro, a autora nomeia algumas iniciativas que podem dar-nos esperança - como aconteceu em Abril, durante o Festival Internacional de Jornalismo em Perugia, Itália, com o apelo à instituição de um “Conselho Global para a Criação de Confiança nos Media e a Luta contra a Desinformação”, formado pelos editores dos grandes meios de comunicação.
A concluir, faz uma lista de algumas “vias de trabalho prometedoras”, cuja leitura aconselhamos que seja feita na íntegra - como, aliás, a de todo o estudo.
O trabalho de Myriam Redondo, em Cuadernos de Periodistas