Apelo de investigadores contra “fake news” em divulgação científica
“Numa democracia, os jornalistas têm uma responsabilidade pesada, visto que, da liberdade de que dispõem, bem como da qualidade da informação divulgada, depende a qualidade do debate público e das escolhas que dele decorrem. O método científico, por seu lado, permite a obtenção de conhecimentos fiáveis que podem servir de base de reflexão para as políticas públicas, em questões complexas como as da alimentação, da saúde pública ou da ecologia.”
“Torna-se então evidente que a comunidade científica e os jornalistas devem trabalhar de mãos dadas, não devendo a primeira isolar-se dos media, por receio de ver os seus trabalhos deformados, e não devendo os segundos permitir a si mesmos a deformação, nem do trabalho da primeira, nem dos factos.”
“É sobre este último ponto que apelamos aos agentes dos meios de comunicação. Assistimos hoje a uma distorção crescente do trabalho dos cientistas. Os seus resultados, com muita frequência, só são expostos se reforçam as opiniões estabelecidas. Em caso contrário, há mesmo quem subentenda a sua remuneração por algum lobby maldoso.”
“Sejamos claros: o estado dos nossos conhecimentos não pode ser comparado a um supermercado em que se possa escolher o que nos convém e deixar na plateleira aquilo que contradiz as nossas opiniões.” (...)
“Bem entendido, a ciência não tem resposta para tudo. Há questões que não conduziram a um consenso claro, ou que continuam mesmo sem resposta. É então perfeitamente legítimo, para um meio de comunicação, apresentar e explicar o debate ocorrido.”
“Mas, se o consenso existe, o jornalista deve ser capaz de o identificar, de procurar compreendê-lo e descrevê-lo. Não é desejável dar o mesmo peso a um facto científico devidamente estabelecido e à sua negação. Por exemplo, seria impensável que, depois de quinze minutos de um assunto sobre a estação espacial internacional, fossem dados outros quinze minutos de antena aos adeptos da Terra plana.”
“Compreendemos que os ‘mercadores da dúvida’, incluindo alguns cientistas, tenham tentado e continuem a tentar desviar o público desse consenso. No entanto, os jornalistas enganam-se no alvo se tomarem a comunidade científica como sua inimiga. E esta última estaria em risco de se afastar ainda mais dos jornalistas.” (...)
O documento que aqui citamos inclui alguns exemplos de consenso científico adquirido em diversos campos, como os da saúde (o cálculo de benefício/risco das principais vacinas é claramente a favor da vacinação, e não há qualquer prova de uma eficácia específica dos produtos homeopáticos), da agricultura e das alterações climáticas.
Mais informação em L’Express e o documento citado, com os nomes dos seus signatários, em L’Opinion.