“Cortamos uma e aparece outra”  -  é a frase, citada em The New York Times, por um funcionário da Rappler, uma empresa filipina encarregada de eliminar as notícias falsas do Facebook no seu país. Traduz bem, como na história da hidra de sete cabeças, “a impotência deste novo emprego destinado a manter a verdade na Net”. (...) 

Segundo o autor do artigo que citamos, a rede social de Mark Zuckerberg tornou-se o epicentro da mentira digital. 

“A chegada de Trump à Casa Branca foi vivida em paralelo com o triunfo do Brexit nas urnas. Em ambos os casos, crê-se que a mentira desempenhou um papel essencial na hora de inclinar a balança dos votantes, que foram supostamente manipulados, sobretudo pelas redes sociais. Não são casos únicos, mas são paradigmáticos e os que forçaram o Facebook a reagir.” 

Uma dessas respostas foi a criação da Rappler, fundada nas Filipinas por Maria Ressa, ex-directora da CNN em Manila e Jakarta, na Indonésia  - portanto boa conhecedora do Sudeste Asiático. 

“Fundou-a em 2012 como um meio de comunicação centrado no entretenimento e investigação, e com o objectivo de que os mais indefesos no mundo tivessem uma voz. A realidade é que teve de se focar na limpeza das redes: o Facebook contratou a Rappler para limpar de notícias falsas as paredes dos filipinos, entre os quais 97% dos que têm acesso à Internet utlilizam aquela rede social.” 

Em Maio de 2016 foram detectadas contas falsas que divulgavam conteúdos favoráveis a Rodrigo Duterte, que ganhou as eleições presidenciais em Junho do mesmo ano. A Rappler ainda não trabalhava para o Facebook em 2016, mas a observação do que tinha acontecido nas Filipinas levou Maria Ressa e encontrar-se em Singapura, em Agosto do mesmo ano, com os executivos regionais da mesma rede. 

“Se não resolvem isto”  - advertiu -  “vão ter problemas nas próximas eleições de Novembro, nos Estados Unidos.” O resto é história, e Trump mora na Avenida da Pensilvânia. 

Talvez esta advertência tenha levado o Facebook a confiar nela na hora de implementar medidas contra as notícias falsas. Em Dezembro desse mesmo ano, a rede social eliminava uma quantidade de perfis falsos que a Rappler tinha identificado e denunciado à empresa. 

“Estamos a limpar o desastre do Facebook”  - reconhece uma funcionária, acrescentando que se trata de uma tarefa “frustrante”. Os profissionais da Rappler queixam-se de que a rede social não oferece a suficiente transparência de que precisam para levar a cabo a tarefa, a que se soma o facto de a tecnologia que está a desenvolver ainda não se encontra disponível (como a que permite verificar também o texto que aparece inscrito nas fotos e nos vídeos, geralmente usado para desinformar evitando a detecção).” 

"A isto acrescentam-se as ameaças de morte e de violação que garantem ter recebido. A Rappler chegou a avaliar a possibilidade de substituir as janelas por vidros à prova de bala e duplicou o seu pessoal de segurança." (...)

E os comentários?

 

No espaço da desinformação figuram também determinados conteúdos que não podem classificar-se como notícias, mas encaixam noutro género do jornalismo: a opinião. São os comentários a seguir às notícias, que os meios digitais usam para criar adesão e não serem acusados de censura da opinião dos utentes. 

“O problema é que as secções de comentário acabaram por se tornar poços de lixo sobre os quais flutua a bandeira da liberdade de expressão. São as bancas dos trolls, tanto dos que se dedicam a contaminar por pura diversão, como dos que o fazem recebendo remuneração e directrizes dos seus patrões  - que podem ser Estados, recorde-se.” 

Um relance pela secção de comentários de qualquer jornal dá uma ideia do que prolifera neste espaço. Negativismo, ódio e radicalização talvez sejam naturais ao ser humano e, como explica Zizi Papacharissi, docente de Comunicação na Universidade de Illinois-Chicago, a Internet torna-se “uma saída fácil para gritar e fazer-nos sentir satisfeitos por um momento”. Escrever um comentário pode ser uma forma de “descarregar frustração diante de realidades que nos inquietam”. 

“O problema está em que estes comentários dependem, ou de media que não dispõem dos recursos necessários para fazerem a sua correcta moderação, ou ficam nas mãos de gigantes como Facebook ou Disqus, que fizeram da liberdade de expressão um mantra sem excepções.” 

“É uma fissura que sabem explorar os mentirosos, já que muitos destes comentários são pura mentira, muitas vezes acrescidos de links encarregados de inocular o vírus das notícias falsas mesmo nos meios de comunicação mais sérios e fiáveis que possamos imaginar.” 

 

O artigo original aqui citado, em Media-tics