A “guerra pela verdade” em livro de jornalista sobre os Media e Trump
Segundo a primeira apresentação da obra em The Washington Post, publicada uma semana antes do lançamento - e que aqui citamos do Expresso - o autor conta que “a equipa de Trump cunhou um novo termo secreto para se referir ao comportamento do líder — ‘transtorno do desafio’. A expressão faz referência à compulsão do Presidente para fazer exactamente o oposto daquilo que os seus conselheiros dizem ser o melhor, deixando esses mesmos conselheiros a tentar apanhar as peças no rescaldo de cada decisão”. (...)
Isso aconteceu, por exemplo, “num sábado de manhã em Março, quando Trump lançou um ataque a Obama no Twitter, acusando-o - sem quaisquer provas - de ter ordenado escutas à sua sede de campanha para as presidenciais de 2016. ‘Ninguém na Casa Branca sabia o que fazer’, escreve Kurtz.”
“Priebus, que deixaria de ser chefe do gabinete de Trump em Julho, viu o seu telefone ser inundado de chamadas e mensagens de texto às quais não sabia como reagir. ‘Priebus sabia que a equipa ia ter de se organizar para provar que o tweet era correcto’, o oposto daquilo que costuma ser o processo de decisões nestes cenários.” (...)
“Apesar de Kurtz parecer, por vezes, oferecer um retrato mais abonatório dos funcionários da Casa Branca do que outros relatos nos media, também capta a forma como a Casa Branca tem estado a contorcer-se para executar as tarefas mais básicas e como os conselheiros [de Trump] têm reagido aos caprichos de um Presidente difícil de controlar”, aponta o Washington Post com base nos excertos do livro.” (...)
“Nos excertos da obra, outra das personagens que ganha destaque é a conselheira Kellyanne Conway, responsável por cunhar o termo ‘factos alternativos’ para defender as mentiras do Presidente Trump e apresentada no livro como uma das pessoas com mais capacidades para o acalmar.” (...)
Outra resenha sobre o livro, publicada no mesmo Washington Post na véspera do lançamento e assinada por Margaret Sullivan, a editora sobre media neste jornal, contesta a afirmação - feita pelo próprio autor, Howard Kurtz - de que há de facto uma guerra entre o Presidente e a Imprensa nacional.
“Eu não concordo - diz - e suspeito que Kurtz, um jornalista experimentado que esteve décadas no Washington Post, sabe que não é verdade.”
“Isto não é realmente guerra, mas por vezes é uma coisa quase tão desagradável: uma co-dependência. O que se passa actualmente entre Trump e a Imprensa é que ele - como outros políticos antes dele - precisa de um inimigo conveniente para manter em brasa a sua base de apoiantes.” (...)
“Quanto aos jornalistas, podem ficar preocupados com o dano das constantes acusações de fake news que Trump faz ao seu ofício, o que é uma preocupação legítima. Na sua maior parte, no entanto, estão a tentar fazer a cobertura dele, não a deitá-lo abaixo. (Como disse o editor do Washington Post, Martin Baron, ‘Nós não estamos em guerra; estamos a trabalhar.’) Mas é aqui que entra a co-dependência: estão a aproveitar toda a vantagem do modo como Trump chama a atenção para o seu trabalho; segundo as suas próprias palavras, ele é ‘uma máquina de audiências’.” (...)
Margaret Sullivan acha que a “lealdade” de Howard Kurtz aos seus actuais patrões da Fox News “é evidente desde o início” e critica o modo como defende Kellyanne Conway na criação da famosa expressão “factos alternativos” (admite mesmo que podíamos ser tentados a vê-la como uma “co-autora” do livro). Comparando Media Madness com Fire and Fury, é de opinião que esta segunda obra “é muito mais amável para com a administração de Trump”. (...)
Também o diário britânico The Guardian publica uma apresentação do livro, pelo chefe da sua delegação em Washington, David Smith.
O seu artigo descreve Donald Trump como “obcecado com os media, que mede a lealdade dos membros da sua equipa pelo modo como o defendem na televisão”.
Segundo conta, Kurtz afirma que “a sua sensibilidade à cobertura pelos media é única na história presidencial dos EUA”, indo ao ponto de encarregar o então secretário de Imprensa, Sean Spicer, de telefonar aos que o tinham defendido, com o cumprimento de que o Presidente achava que tinham feito “bom trabalho”. Quando Trump via alguma reportagem que considerava injusta para si, usava o Twitter para achincalhar o programa, ou a rede televisiva em causa.
O texto que citamos conta ainda que Kurt Bardella (que foi porta-voz da conservadora Breitbart News e é agora colaborador no HuffPost e na USA Today) afirmou, sobre este livro, que “Kurtz é um narrador quase tão simpático como Trump e a sua Administração poderiam encontrar”, mesmo quando “retrata uma Casa Branca que não faz ideia do que está a fazer”. (...)
Ainda segundo Bardella, Kurtz mostra “uma equipa cercada, não pelos media mas pelo seu próprio chefe”:
“As cenas descritas por Kurtz ilustram o motivo pelo qual a Casa Branca tem pouca ou nenhuma credibilidade - sobretudo porque, seja o que for que eles digam, é provável que o chefe os venha a contradizer.” (...)
Mais informação no Expresso, no Washington Post e em The Guardian. Ler também no espaço de Opinião deste site crónica de J. Botelho Tomé sobre o mesmo livro