Rui Ramos começou por caracterizar a nossa história desde o séc. XIX como “uma série de esforços de adaptação de Portugal a padrões institucionais, económicos e culturais da Europa Ocidental  -  ter uma Constituição (a primeira muito adaptada da Carta Constitucional que Louis XVIII deu à França), ter um Governo parlamentar, Escola Pública, ter uma rede de transportes, tudo isto feito à imitação do que se estava a passar na Europa Ocidental e, por vezes, com uma participação directa dessa Europa Ocidental”. 

 

Estes esforços foram por vezes identificados com uma rejeição das que seriam as tradições nacionais (lembrar a famosa conferência de Antero de Quental sobre as Causas da Decadência dos Povos Peninsulares).

Outras vezes foram tratados com ironia: Os Maias, de Eça de Queirós, têm passagens “como a famosa cena das corridas de cavalos no hipódromo de Belém, que parece ironizar sobre aquele esforço desesperado da sociedade portuguesa para parecer que se está em Paris ou em Londres”...

 

O orador lembrou que outros cidadãos conduziram reacções contra aquilo que parecia ser a “estrangeirização” de Portugal e, pelo contrário, fizeram o “aportuguesamento” de Portugal, “tentaram descobrir, por contraste com a Europa, uma espécie de cultura nacional, uma cultura própria dos portugueses, que os distinguiria para sempre e definitivamente dos outros povos, sobretudo os da Europa Ocidental”.

 

“Para alguns, como os que apoiaram Salazar com convicções integralistas, ou para os comunistas de obediência soviética, Portugal não devia ser como os outros países da Europa Ocidental. E para outros, como alguns salazaristas e alguns anti-salazaristas mais liberais, Portugal, infelizmente, não conseguia ser como os outros países da Europa Ocidental.”

 

Segundo Rui Ramos, este debate ainda continuou até meados do séc. XX, mas os portugueses foram sendo integrados na Europa Ocidental a partir do pós-guerra, primeiro ainda por iniciativas dos governos de Salazar e Marcelo Caetano (adesão à NATO e à EFTA, depois ao Mercado Comum) e a seguir por escolha das centenas de milhares de emigrantes, que partiam sobretudo para a França e a Alemanha. A própria Oposição ganhou “novos núcleos de exilados baseados na Europa Ocidental e patrocinados por forças políticas ocidentais  – o caso do Partido Socialista em 1973”.

 

“Isso quer dizer que a partir da década de 50 há uma ‘europeização’ de referências, de modos de ser, de práticas, na sociedade portuguesa. Até 1974 ou, melhor dizendo, até 1976, ainda faltava a democracia política do tipo ocidental, mas até as próprias expectativas que houve em relação ao marcelismo, de uma liberalização que acabou por não se concretizar, e depois a resistência ao PREC em 1975, mostram que havia na sociedade portuguesa forças determinadas em fazer de Portugal uma sociedade como as outras sociedades da Europa Ocidental.”

 

Mais adiante, afirmou Rui Ramos:

“O projecto de ‘europeização’ não foi único, foi atrapalhado, primeiro pelo integracionismo ultramarino que ainda animou o Estado Novo, (...) depois pelo revolucionarismo terceiro-mundista de 1974/75… Eduardo Lourenço tem uma frase que eu gosto muito de citar a este respeito, ele diz que 74/75 foi o momento em que as Forças Armadas descobriram que Angola não era Portugal e se convenceram que Portugal era Angola, isto é, que podiam fazer aqui a ‘africanização’ do País”…

Passando aos problemas trazidos pela integração, Rui Ramos citou o arrastamento do processo de adesão, o facto de "recebermos ajudas económicas de uma Comunidade Económica Europeia muito enviesada pelos interesses de certos países, que canalizavam muitos recursos para a Política Agrícola Comum, onde, de facto, Portugal não teve grande possibilidade de explorar os recursos da CEE como outros países", e ainda o processo de criação do Euro, que pode ser retrospectivamente identificado como “não demasiadamente bem pensado”.

 

No entanto, o orador refutou algumas críticas correntes à UE e ao Euro, que  - afirmou -  não têm sentido.

 

1 - Que a UE põe em causa a democracia:

“A União Europeia não é uma democracia, é composta de democracias, no sentido em que é integrada por democracias e dirigida pelo Conselho Europeu, onde estão representados Governos legítimos com apoio dos Parlamentos dos vários países. Isto dá ao processo europeu um aspecto de negociação diplomática, nem sempre transparente, mas só assim é possível.”

 

2 - Que esmaga os pequenos países:

“Não é certo que os esmague mais caso não existisse a União Europeia, e a Europa fosse condicionada pelas grandes potências que estivessem libertadas de quaisquer estruturas comunitárias…”

 

3 - Que o Euro nos tirou competitividade:

“O Euro correspondia ao projecto de passar de uma competitividade baseada em baixos salários para uma competitividade baseada no aumento da produtividade. Foi o Euro que impediu essa passagem? O Euro provavelmente criou uma tentação, de usar o crédito para adiar reformas, mas não foi o Euro em si, foram estruturas que estavam em Portugal que o aproveitaram dessa maneira.”

 

“O projecto de europeização ainda faz sentido? A integração europeia é o melhor meio para realizar esse projecto?”  -  perguntou Rui Ramos. E concluíu: “Faz sentido, é aquele que corresponde à nossa identidade, e a integração continua a ser garantia e meio de fazer gradualmente esse processo.”