A batalha perdida de uma senhora que gostava de vender jornais …
"Eu gostava das pessoas que vinham buscar o seu jornal de manhã cedo; dos miúdos que entravam para ver um resultado no jornal L’Equipe, e que eu deixava, na condição de que dessem os bons-dias; das pessoas de idade que vinham conversar à tarde. (…) Hoje, alguns tratam-me por tu e ficaram meus amigos; outros passaram a abrir-se comigo, a falar de política. Há crianças que eu vi nascer, adolescentes que procuravam abrigo junto de mim quando tinham problemas com o outro bando do bairro, os clientes idosos com quem eu me preocupava quando deixava de os ver."
O discurso de Isabelle Pélissié, que aqui citamos de uma entrevista ao diário Le Monde, passa por entre as boas recordações, a saudade de uma profissão que amava e a lucidez dos motivos de desistência.
Estes foram-se acumulando e fazem uma mistura de causas diferentes :
"As coisas começaram a mudar por volta de 2000. Aos poucos, os meus clientes foram envelhecendo, sem serem substituídos por uma nova geração. Nessa época vi também muitos centrarem-se sobre a sua religião ou a sua comunidade, dizendo-me que já não tinham confiança nos meios de comunicação."
Houve também os aumentos de preços :
"Os jovens descarregam gratuitamente a música e os filmes, já só dão uma vista de olhos à Imprensa. Nos últimos tempos, os jornais não representam mais do que a metade do meu negócio. O resto são produtos de papelaria e um pouco os livros, coisas sem as quais eu não teria conseguido aguentar."
Finalmente, as greves de finais de 2012, princípios de 2013 (contra o projecto de reestruturação das distribuidoras NMPP), e os conflitos subsequentes com a dominante Presstalis, período em que chegou a ficar sem entregas de jornais por um atraso de pagamento de três dias…
A "cereja em cima do bolo", como conta, foram os roubos: os homens que fazem a entrega dos jornais durante a noite deixavam-nos naquele espaço entre a grade exterior e a porta de vidro, e tudo corria bem, mas a partir de Maio começaram a ser roubados. Isabelle passou a ter de lá ir às seis da manhã, metê-los dentro da loja, voltar a casa e vir abrir a porta às sete e meia.
Quando decidiu vender o local, ainda tentou que continuasse a ser um quiosque de jornais, fez esse pedido expresso às agências, mas ninguém se manifestou. Levou um ano até conseguir aceitar que fosse outra coisa. Depois, quando anunciou que ia fechar, choveram as lamentações:
"Houve um senhor que me disse: ‘Que pena, o que a senhora faz é verdadeiramente útil.’ E eu respondi-lhe: ‘Mas o senhor comprava o seu jornal todos os dias, e depois deixou… "
"Alguns dizem-me: ‘Sabe, a senhora é a única pessoa a quem eu falo durante todo o dia.’ E há pessoas de idade e crianças que choram. É comovente."
A entrevista de Isabelle Pélissié no Le Monde