As palavras que escrevemos (ou gravamos em ficheiro de voz), as músicas favoritas, as imagens e os vídeos, vão enchendo o espaço digital que habitamos. O que lhes acontece quando morremos? Quem administra a nossa “pegada” digital?
Como todas as heranças, também esta pode ser um lugar de memória e de saudade, ou tornar-se uma fonte de problemas e de conflitos, mesmo legais. “Se os nossos pertences digitais fossem como os materiais, todos nós seríamos parecidos com os acumuladores compulsivos” - diz a psicóloga Elaine Kasket, autora de All the Ghosts in the Machine: Illusions of Immortality in the Digital Age [em tradução literal, “Todos os Fantasmas na Máquina: Ilusões de Imortalidade na Era Digital”].
Amelia Tait, uma jornalista especializada nas subculturas da Internet, recolheu uma série de exemplos do que pode acontecer, entre a pessoa falecida e os seus parentes, entre estes e as plataformas, entre estas e a Lei (quando existe), a respeito de palavras-passe, de últimas vontades a cumprir, de acesso e destino a dar aos ficheiros.
“Fica claro que, se não começarmos a tomar decisões a respeito das nossas mortes digitais, então alguém as vai tomar por nós” - avisa.
“Hoje é sexta-feira, 14 de Janeiro de 2010. Só queria dizer: espero muito que ainda esteja viva quando este post chegar.”
Esther Earl, a jovem de 16 anos que o escreveu, sucumbiu a um cancro em Agosto do mesmo ano. Mas a família e amigos receberam a mensagem, com o choque que se imagina, a 18 de Fevereiro de 2011.
A mãe da menina, com quem falou a autora do artigo que aqui citamos, acredita que ela não o redigiu, com aquela marcação de data de envio, como uma espécie de “mensagem póstuma” para os seus próximos, mas para si mesma, manifestando “a sua esperança e desejo de continuar a viver”...
Ela tinha usado um serviço chamado FutureMe, que permite a uma pessoa mandar e-mails a si própria, deixando claro que eram para ser lidos pelos pais, em caso de morte. A mãe, Lori Earl, conta de um deles:
“Essa carta fez-nos chorar, mas também nos trouxe grande conforto, penso que por causa da sua intencionalidade, pelo facto de ela estar a pensar no seu futuro, a clareza com que aceitava quem era e quem esperava vir a ser.” (...)
Ela própria admite a hipótese de, numa situação de morte próxima, programar mensagens semelhantes para o marido e os outros filhos, mas deixando claro quantas tinha redigido e quando iriam chegar, porque de outro modo iriam causar ansiedade.
Agora já há coisas de outra natureza, como as aplicações Replika e a Eternime, que são chatbots de inteligência artificial, capazes de imitar o nosso modo de falar para as pessoas de quem gostamos, depois de termos morrido.
Mas, como explica a autora deste artigo, que citamos de The Guardian, “planear a nossa morte digital não é simplesmente organizar uma agenda de updates para as pessoas de quem gostamos, ou construir um ‘avatar’ de inteligência artificial”:
“Na prática, é uma quantidade de decisões sem graça, a respeito de como apagar as nossas contas de Facebook, Twitter e Netflix; de proteger o nosso e-mail de ataques dos hackers; como entregar a nossa colecção de música aos nossos amigos; como dar consentimento à família para ir buscar fotografias à nossa cloud; e garantir que os nossos segredos online permanecem ocultos nos seus sepulcros digitais.”
“Devíamos pensar com muito cuidado sobre tudo o que confiamos ou alojamos em qualquer plataforma digital” - diz Elaine Kasket.
A sua opinião é que o nosso monte de dados digitais pode causar complicações sem fim às pessoas de quem gostamos, principalmente quando não têm acesso às nossas palavras-passe. O texto conta a história de um homem que, tendo sido escolhido como testamentário pelo pai, antes de falecer, verificou que a lista de palavras-passe que ele deixou já estavam caducadas, não conseguindo sequer abrir o seu computador. A Microsoft recusou-se a facilitar este acesso, por motivos de “privacidade”.
A maior parte das pessoas acha que, tendo feito download de músicas no iTunes, ou de jogos na PlayStation, eles lhes pertencem, mas a maioria desses procedimentos são de uma licença que termina com a morte.
“O que nós queremos fazer e aquilo que a lei nos consente, com a nossa herança digital, podem ser coisas muito diferentes.”
“A regulamentação é sempre muito lenta a acompanhar a tecnologia” - volta a dizer Elaine Kasket. “Isto significa que as plataformas e as empresas como o Facebook acabam por ser elas a redigir as regras.” (...)
Nos Estados Unidos, a legislação recente contida no Data Protection Act 2018 define os “dados pessoais” como referindo-se unicamente a pessoas em vida.
A concluir, Amelia Tait descreve várias situações em que, por esta via da protecção de privacidade, há conflitos passíveis de chegarem aos tribunais.
O artigo aqui citado, na íntegra em The Guardian.
Na Rússia, alguns “media” estão a utilizar métodos pouco convencionais para realizar reportagens de investigação e escrutinar o governo de Vladimir Putin.
De acordo com o “New York Times”, estas publicações estão a recorrer à rede social Telegram e à “darkweb” para aceder a bases de dados, obter informações sobre geolocalização e, ainda, consultar registos de viagens aéreas.
Estes métodos são conhecidos por “probiv” -- “perfurar”, em tradução livre -- e permitiram identificar, por exemplo, a célula responsável pelo envenenamento do líder da oposição, Alexei Navalny.
Além disso, graças ao “probiv”, estes projectos de “media” conseguiram publicar histórias exclusivas sobre a “família secreta de Putin” e sobre a interferência russa, em 2016, nas eleições presidenciais norte-americanas.
Com tudo isto, o jornalismo independente russo atingiu um nível “que não se via desde o final da década de 1990”, considerou Denis Volkov, o director do Levada Center, um grupo de pesquisa de opinião pública.
O “probiv” é, contudo, um fenómeno exclusivo da Rússia, já que a maioria dos “media” internacionais rege-se pelo princípio ético de não pagar por informação roubada.
“ As nossas audiências não querem saber se a informação foi ou não roubada”, afirmou Roman Anin, o fundador da plataforma iStories. “Como vivemos num país onde as autoridades matam os líderes de oposição, esquecemo-nos dessas regras [de ética], porque as nossas histórias são muito mais importantes”.
Da mesma forma, o criador do “site” Proekt, Roman Badanin, considera que o número de leitores compensa qualquer desrespeito pelo código deontológico.
A jornalista portuguesa Catarina Canelas recebeu o Prémio Rei de Espanha na Categoria de Ambiente, graças à reportagem "Plástico: o Novo Continente".
Atribuída por unanimidade do júri, a distinção sublinha as “imagens impactantes que reflectem um enorme problema global e a invasão dos plásticos nos mares”.
Graças a estes elementos visuais, a reportagem conseguiu destacar-se entre as 155 candidaturas submetidas por mais de duas dezenas de países ibero-americanos.
Composta por sete episódios e exibida, pela TVI, em Agosto do último ano, a série documental foi realizada em conjunto com João Franco, Nélson Costa e Teresa Almeida, resultando num trabalho que, “documenta de forma extensa, (..) os perigos que pressupõem a presença do plástico no oceano”.
Esta reportagem contou, ainda, com a “opinião de especialistas, investigadores, cientistas, organizações conservacionistas e ecologistas que trabalham também na luta contra o plástico”.
A jornalista afirmou, entretanto, através das redes sociais que,“este reconhecimento de uma distinção tão importante a nível internacional é uma honra e um orgulho imenso”.
A série de reportagens está disponível no TVI Player.
Ao completar 40 anos de actividade ininterrupta o CPI – Clube Português de Imprensa tem um histórico de que se orgulha. Foi a 17 de dezembro de 1980 que um grupo de entusiastas quis dar forma a um projecto inédito no associativismo do sector.
Não foi fácil pô-lo de pé, e muito menos foi cómodo mantê-lo até aos nossos dias, não obstante a cultura adversarial que prevalece neste País, sempre que surge algo de novo que escapa às modas em voga ou ao politicamente correcto.
O Clube cresceu, foi considerado de interesse público; inovou ao instituir os Prémios de Jornalismo, atribuídos durante mais de duas décadas; promoveu vários ciclos de jantares-debate, pelos quais passaram algumas das figuras gradas da vida nacional; editou a revista Cadernos de Imprensa; teve programas de debate, em formatos originais, na RTP; desenvolveu parcerias com o CNC- Centro Nacional de Cultura, Grémio Literário, e Lusa, além de outras, com associações congéneres estrangeiras prestigiadas, como a APM – Asociacion de la Prensa de Madrid e Observatório de Imprensa do Brasil.
A convite do CNC, o Clube juntou-se, ainda, à Europa Nostra para lançar, conjuntamente, o Prémio Europeu Helena Vaz da Silva para a Divulgação do Património Cultural, instituído pela primeira vez em 2013, em, homenagem à jornalista, que respirava Cultura, cabendo-lhe o mérito de relançar o Centro e dinamizá-lo com uma energia criativa bem testemunhada por quem a acompanhou de perto.
Mais recentemente, o Clube lançou os Prémios de Jornalismo da Lusofonia, em parceria com o jornal A Tribuna de Macau e a Fundação Jorge Álvares, procurando preencher um vazio que há muito era notado.
Uma efeméride “redonda” como esta que celebramos é sempre pretexto para um balanço. A persistência teve as suas recompensas, embora, hoje, os jornalistas estejam mais preocupados com a sua subsistência num mercado de trabalho precário, do que em participarem activamente no associativismo do sector.
Sabemos que esta realidade não afecta apenas o CPI, mas a generalidade das associações, no quadro específico em que nos inserimos. Seriam razões suficientes para nos sentarmos todos à mesa, reunindo esforços para preparar o futuro.
Com este aniversário do CPI fica feito o convite.
A Direcção