Todos começamos o dia vendo se temos mensagens ou chamadas não atendidas e, ao abrir o computador, consultamos a caixa de entrada do nosso correio electrónico. Procuramos notícias de interesse imediato, que podem ser sobre o tempo que faz ou o trânsito que não anda. E se um dia não encontrássemos rádio, nem televisão nem jornais online nos nossos aparelhos?
No último fim-de-semana de Dezembro findo, um ataque informático bloqueou o acesso dos ficheiros destinados às impressoras de Los Angeles Times and Tribune Publishing, atrasando também as edições de sábado de vários outros jornais, incluindo The New York Times e The Wall Street Journal. Não foi descoberta a origem. Crê-se que a motivação seria económica - “sequestrar” os jornais deste modo e exigir resgate - e proveniente de fora dos Estados Unidos.
É deste episódio que parte o jornalista Miguel Ossorio Vega para fazer uma reflexão sobre as alternativas que nos restam, caso ele se repita junto de nós. Se acontecesse connosco, íamos procurar informação aonde? E podemos tomar medidas preventivas?
“Mas os diários afectados não receberam nenhuma indicação a este respeito, o que leva a pensar que os atacantes queriam simplesmente boicotar o seu normal funcionamento - por outras palavras: a publicação de notícias. Uma nova forma de censura com que não contávamos, e que daria asas às fake news, já por si preocupantemente poderosas, que têm nas redes sociais o seu caldo de cultura.”
“Num mundo que acordasse sem notícias, é possível que a primeira alternativa fosse a do Twitter e Facebook, que provavelmente continuariam sem problemas, podendo cuspir qualquer tipo de informação que os atacantes desejassem. Com via livre para evitarem ser refutados.”
O autor acrescenta a este cenário as consequências do acesso pago nas edições online dos jornais, que tem o seu motivo mas também leva muitas pessoas, que se habituaram a ler notícias de graça, a procurá-las noutro sítio...
“Onde? Nas redes sociais, onde espertos de todas as qualidades irão seguramente buscar o pedaço de bolo que fica do lado de fora do muro [paywall]. Se o que contam é verdade ou mentira, não interessa, já que durante duas décadas tivémos um buffet grátis ao alcance de todos e... bastará dar uma vista de olhos ao mundo para saber o que se passa.”
“Vistas as coisas deste modo, seria irrelevante que os meios de comunicação sofressem um ataque maciço e coordenado que os deixasse fora de jogo durante vários dias, já que, mesmo com eles no tabuleiro de jogo, muitas pessoas acreditaram em coisas que cheiram a mentira à distância de quilómetros.”
E Miguel Ángel Ossorio Vega conclui:
“O outro lado desta notícia é que, se ainda não estamos a matar-nos uns aos outros, talvez seja, provavelmente, porque ainda há uma percentagem de população que consulta todos os dias media verdadeiros e tem uma opinião informada sobre aquilo que realmente acontece no mundo, procedendo de modo consequente.”
“Devemos proteger os media com alguma coisa mais do que anti-vírus, se não queremos obrigar até mesmo os cidadãos mas responsáveis a irem refugiar-se no esgoto enquanto abranda a tempestade de um ciber-ataque.”
O artigo aqui citado, na íntegra em Media-tics
Na década de 1980, um grupo de colaboradores dos “media” brasileiros fez aprovar uma lei para a regionalização da produção jornalística, educativa e cultural, recordou Chico Sant’Anna num artigo publicado no “Observatório da Imprensa”, associação com a qual o CPI mantém um acordo de parceria.
Contudo -- segundo recordou o autor -- este documento nunca foi aplicado. Assim, as grandes operadoras brasileiras passaram a produzir uma “grelha” de conteúdos uniformes, focada nos grandes polos económicos do país, e omitindo a diversidade cultural dos diversos Estados.
Agora, a realidade pode estar prestes a mudar, por iniciativa do Conselho Administrativo de Defesa Económica – Cade.
O Cade -- órgão vinculado ao ministério da Justiça -- realizou, recentemente, uma análise às “condutas anticompetitivas" do sector mediático.
A conclusão foi de que a estruturação dos “media” em redes nacionais é algo “negativo”, porque “limita a variedade de conteúdo, sendo transmitida menos programação do que existiria, se cada geradora fosse directamente responsável pelos [seus] produtos audiovisuais”.
Além disso, uma maior pluralidade na produção de conteúdos geraria mais emprego, faria as receitas da indústria cultural circularem e abriria oportunidades para profissionais que não migraram para os polos de produção.
A regionalização da produção cultural e mediática facilitaria, igualmente, a representação de todos os cidadãos brasileiros, promovendo, ainda, talentos de todos os cantos do país.
Ao completar 40 anos de actividade ininterrupta o CPI – Clube Português de Imprensa tem um histórico de que se orgulha. Foi a 17 de dezembro de 1980 que um grupo de entusiastas quis dar forma a um projecto inédito no associativismo do sector.
Não foi fácil pô-lo de pé, e muito menos foi cómodo mantê-lo até aos nossos dias, não obstante a cultura adversarial que prevalece neste País, sempre que surge algo de novo que escapa às modas em voga ou ao politicamente correcto.
O Clube cresceu, foi considerado de interesse público; inovou ao instituir os Prémios de Jornalismo, atribuídos durante mais de duas décadas; promoveu vários ciclos de jantares-debate, pelos quais passaram algumas das figuras gradas da vida nacional; editou a revista Cadernos de Imprensa; teve programas de debate, em formatos originais, na RTP; desenvolveu parcerias com o CNC- Centro Nacional de Cultura, Grémio Literário, e Lusa, além de outras, com associações congéneres estrangeiras prestigiadas, como a APM – Asociacion de la Prensa de Madrid e Observatório de Imprensa do Brasil.
A convite do CNC, o Clube juntou-se, ainda, à Europa Nostra para lançar, conjuntamente, o Prémio Europeu Helena Vaz da Silva para a Divulgação do Património Cultural, instituído pela primeira vez em 2013, em, homenagem à jornalista, que respirava Cultura, cabendo-lhe o mérito de relançar o Centro e dinamizá-lo com uma energia criativa bem testemunhada por quem a acompanhou de perto.
Mais recentemente, o Clube lançou os Prémios de Jornalismo da Lusofonia, em parceria com o jornal A Tribuna de Macau e a Fundação Jorge Álvares, procurando preencher um vazio que há muito era notado.
Uma efeméride “redonda” como esta que celebramos é sempre pretexto para um balanço. A persistência teve as suas recompensas, embora, hoje, os jornalistas estejam mais preocupados com a sua subsistência num mercado de trabalho precário, do que em participarem activamente no associativismo do sector.
Sabemos que esta realidade não afecta apenas o CPI, mas a generalidade das associações, no quadro específico em que nos inserimos. Seriam razões suficientes para nos sentarmos todos à mesa, reunindo esforços para preparar o futuro.
Com este aniversário do CPI fica feito o convite.
A Direcção