A instantaneidade e facilidade de acesso trazidas pela revolução digital podem servir ou agredir a missão do jornalismo. Todo o profissional tem hoje consciência da vulnerabilidade do tráfego e da necessidade de assumir procedimentos de segurança. Um jovem jornalista brasileiro, começando pela sua própria experiência e seguindo outros modelos que procurou, lançou recentemente um site especializado em “Privacidade para Jornalistas”, com este mesmo título.
Raphael Hernandes, repórter de audiência e dados na Folha de S. Paulo, definiu uma análise das ameaças para chegar às melhores alternativas para combater “a vigilância, o hacking e a colheita e retenção de dados pelos mais variados adversários, de governos a bisbilhoteiros casuais, passando por corporações e criminosos”.
O modelo que o inspirou mais de perto foi o australiano Privacy for Journalists, da organização sem fins lucrativos CryptoAustralia.
Uma das suas primeiras preocupações é a protecção do sigilo das fontes:
“De acordo com Gabor Szathmari (o fundador da CryptoAustralia) as medidas de segurança mais básicas incluem substituir programas de mensagem como o Messenger e o Skype por plataformas encriptadas, como Sinal e Wire. Em casos mais sigilosos, outras medidas são necessárias. ‘Deixe o seu smartphone em casa se você vai se encontrar com a fonte - ele é uma máquina espiã. Sugiro evitar o computador em geral e tirar a poeira do bom e velho bloco de notasm caso sejam anotações muito sigilosas’, recomendou.”
Entre as mais básicas ferramentas de protecção, Raphael Hernandes aconselha a criptografia de HD e de pen-drives; a autenticação por duas etapas; a aplicação Signal, disponível para smartphones, para protecção de mensagens; o sistema de armazenamento em “nuvem” Sync.com; e a PGP – Pretty Good Privacy, para encriptar e-mails.
O artigo citado, que contém os links para o site e cada uma das rubricas mencionadas
Os jornalistas devem manter-se fiéis aos valores de ética e deontologia, reconhecendo a importância do seu trabalho para a vida democrática, e lutando para melhorar as condições de trabalho no sector mediático, considerou Miguel Ormaetxea num texto publicado no “site” Media-Tics.
Conforme apontou Ormaetxea, o jornalismo em Espanha está a enfrentar um período difícil, uma vez que, de forma a conseguirem emprego, os profissionais dos “media” aceitam escrever peças de pouco interesse, limitando-se a partilhar informações superficiais “ad nauseam”.
Além disso, continuou o autor, os profissionais espanhóis parecem ir todos atrás das mesmas histórias, resultando em bancas de jornais repletas de “manchetes” semelhantes e, por vezes, contraditórias.
Perante este cenário, Ormaetxea pede aos jornalistas que contrariem o “status quo”, deixando de sucumbir às vontades de grandes empresários de “media”, que “só sabem demitir, cortar salários e despesas”.
Até porque, de acordo com o articulista, a sobrevivência do jornalismo depende do investimento em “ qualidade, em inovação, em novas tecnologias, e em talento''.
Neste sentido, Ormaetxea considera essencial que os jornalistas deixem, também, de aceitar as exigências do governo, que promovem conferências de imprensa sem a possibilidade de intervenção dos repórteres, o que representa um ataque à liberdade de imprensa.
Da mesma forma, o autor recorda que os profissionais dos “media” devem parar de arriscar a sua vida “em troca de uns tostões”, e de “peças mal amanhadas”.
A instabilidade política e social na Venezuela levou muitos jornalistas a radicaram-se em países vizinhos, como forma de garantir a sua segurança e subsistência financeira.
Foi esse o caso de Pierina Sora, uma jornalista de Caracas que, em 2018, se mudou para o Peru. No entanto, esta profissional continua a informar os cidadãos venezuelanos, lutando pela liberdade de imprensa, conforme explicou em entrevista ao “Observatório da Imprensa”, com o qual o CPI mantém um acordo de parceria.
De acordo com Sora, a Venezuela está, de momento, a “atravessar uma complexa crise humanitária”, que levou muitos outros cidadãos a seguirem o seu exemplo, e a mudarem-se para o Peru.
Foi perante este cenário que Sora decidiu criar o projecto “Cápsula Migrante”, um “site” lançado em Maio de 2020, no contexto da crise pandémica, com o objectivo de apoiar “a comunidade migrante”.
Este projecto serve, também, como alternativa aos cidadãos que continuam na Venezuela, e que têm dificuldade em aceder a jornalismo de qualidade, devido às restrições impostas pelo governo.
Tal como explicou Sora, as dificuldades na Venezuela verificam-se tanto a nível de ataques físicos aos colaboradores dos “media”, como na restrição do acesso ao papel para imprimir jornais, e, ainda, no bloqueio da internet.
Assim, o “Cápsula Migrante”, juntamente com outros projectos de jornalismo local e hiperlocal, tem tentado “dedicar-se às comunidades”, dando-lhes poder através da “informação de qualidade”.
Os ciberataques passaram a fazer parte da paisagem mediática portuguesa. Depois do Grupo Impresa ter sido seriamente afectado, juntamente com a Cofina, embora esta em menor grau de exposição, chegou a vez do Grupo Trust in News, que detém o antigo portfólio de revistas de Balsemão, como é o caso do semanário “Visão”.
Outras empresas foram igualmente visadas, em maior ou menor escala, desde a multinacional Vodafone aos laboratórios Germano de Sousa.
Não cabe neste espaço qualquer comentário especializado a tal respeito, mas não nos isentamos de manifestar uma profunda preocupação relativamente à continuidade - e aparente impunidade - destes actos ilegais, que estão a pôr a nu as vulnerabilidades dos sistemas e redes, tanto públicos como privados.
Recorde-se que este site do Clube Português de Imprensa já foi alvo, também, de intrusões pontuais que bloquearam a sua actualização regular, o que voltou a acontecer, embora de uma forma indirecta, como consequência da inoperacionalidade do operador de telecomunicações atingido.
Oxalá estes ataques de “hackers”, já com um carácter mais “profissional”, tenha contribuído para alertar os especialistas e as autoridades competentes em cibersegurança no sentido de adoptarem as medidas de protecção que se impõem.
As fragilidades ficaram bem à vista.